Uma manhã de agosto de 2019, em Hermosillo, Sonora, parecia ser como qualquer outra na vida de Antonio Carlos Mendes. Um dia de trabalho na Fazenda Santa Helena, a 3.000 hectares de produtividade que ele havia construído com as próprias mãos. Antonio era a epítome do fazendeiro de sucesso no norte do México, um homem de 54 anos com a vida organizada e uma família amorosa. Mas quando o sol se pôs, uma sombra de mistério pairou sobre a região. Antonio desapareceu no ar, deixando para trás uma fortuna de 2,5 milhões de dólares em espécie e um enigma que assombraria a família e a comunidade por cinco longos anos. O que aconteceu com o fazendeiro? E por que ele havia guardado tanto dinheiro em seu escritório? A resposta, tão brutal quanto inesperada, só seria revelada anos depois, com a ajuda de uma tecnologia que ele conhecia e admirava: o drone.
Antonio Carlos Mendes era a personificação da prosperidade. Alto, de barba bem aparada e olhos castanhos que brilhavam com determinação, ele era um homem de ação e visão. Nascido de pequenos produtores rurais de Ciudad Obregón, ele chegou a Hermosillo nos anos 80 com apenas um caminhão e o sonho de fazer história no agronegócio. Por três décadas, ele transformou um pequeno pedaço de terra em um império, produzindo anualmente 8.000 toneladas de milho e 6.000 de trigo. Sua receita por safra superava os 10 milhões de dólares. Casado com Marlene, com quem teve três filhos — Carlos Eduardo, Marina Cristina e João Paulo —, Antonio era o pilar da família e da comunidade. Ele era conhecido por sua palavra, seu trabalho incansável e sua paixão pela terra. A fazenda Santa Helena era seu orgulho, e ele havia investido em tecnologia de ponta, incluindo drones para mapeamento das plantações. Antonio era um líder comunitário respeitado, sempre pronto para ajudar, emprestar equipamentos e dar conselhos. “Ele era o tipo de homem que você gostaria de ter como vizinho”, contava Sebastián Ortiz Reyes, fazendeiro da propriedade adjacente. “Quando minha colheitadeira quebrou, ele me emprestou a dele sem pestanejar. Disse que a gente tinha que se ajudar, que o campo era difícil demais para enfrentarmos sozinhos.”
Contudo, a prosperidade de Antonio não o imunizou de pressões. A safra de 2019 havia sido afetada por uma seca prolongada e as flutuações do mercado de commodities impactaram seus lucros. Ele confidenciou ao filho, Carlos Eduardo, que estava dividido por ofertas de compra da fazenda de grupos de investidores estrangeiros. Por um lado, as ofertas poderiam resolver todos os seus problemas financeiros, mas por outro, ele não conseguia imaginar sua vida longe da terra que ele tanto amava. No dia 27 de agosto de 2019, a terça-feira começou como de costume. Antonio acordou às 5 da manhã, tomou seu café preto sem açúcar e saiu para percorrer a fazenda. Voltou para o café da manhã com a família e seguiu para seu escritório, onde passou a manhã ao telefone. Sua secretária, María José Santos, percebeu algo estranho. “Ele falou baixo durante a ligação, coisa que não era normal nele”, ela se recorda. “No final, eu ouvi ele dizer: ‘Está bem, eu vou estar lá às 3 da tarde.’ Quando perguntei quem era, ele disse que era sobre a venda de uma máquina, mas algo no tom dele me deixou intrigada.”
Depois do almoço, Antonio disse à família que tinha uma reunião importante e saiu na sua caminhonete Toyota Tacoma Prata, levando apenas a carteira e o celular. Era 14h45. Foi a última vez que o viram com vida. Quando o jantar da família chegou e ele não, a preocupação virou desespero. Carlos Eduardo saiu à sua procura, mas não encontrou nada. Às 22h, a família chamou a polícia. O sargento Javier Morales, o primeiro a chegar à fazenda, percebeu a gravidade da situação. “Era atípico”, ele lembrou. “Um homem adulto, responsável, sai para uma reunião e simplesmente desaparece.” A busca foi imediatamente iniciada. Bombeiros, policiais, e dezenas de voluntários vasculharam a região, mas a caminhonete e Antonio pareciam ter desaparecido no ar. Não havia sinais de acidentes ou violência.
A investigação tomou um rumo inesperado no terceiro dia de buscas. Ao organizar os documentos do pai, Carlos Eduardo fez uma descoberta impressionante no cofre do escritório. Escondidos atrás de pastas, estavam 2,5 milhões de dólares em espécie. “Eu nunca tinha visto tanto dinheiro junto na minha vida”, disse o filho. “Meu pai sempre usava bancos, não guardava grandes quantias em casa. Foi um choque total.” A descoberta mudou o foco da investigação. O delegado André Luiz Barbosa passou a considerar novas possibilidades: o dinheiro era para um negócio específico? Ele estava sendo chantageado? Ou teria planejado o seu próprio desaparecimento? A análise das contas de Antonio revelou que ele havia feito vários saques grandes nos dois meses anteriores, totalizando exatamente a quantia encontrada no cofre. A família, no entanto, não tinha ideia do porquê.
“Meu marido me contava tudo sobre os negócios da fazenda”, insistia Marlene. “Ele nunca escondeu nada de mim. Não faz sentido ele ter guardado esse dinheiro sem me falar nada.” A investigação revelou que, nas semanas anteriores ao desaparecimento, Antonio recebeu várias ligações de números não identificados. Tentativas de rastreá-los foram infrutíferas. A polícia considerou várias linhas de investigação: lavagem de dinheiro, sequestro… mas nenhuma delas se encaixava perfeitamente. A teoria mais sombria, embora não oficial, era a de que ele teria sido atacado. Mas se fosse por causa do dinheiro, por que a fortuna foi deixada para trás? A família de Antonio viveu um calvário. Marlene desenvolveu depressão e Carlos Eduardo assumiu a administração da fazenda. A comunidade de Hermosillo se uniu para ajudar. “Era como se nossa família tivesse perdido seu centro”, disse Marina. “De repente, tínhamos que aprender a viver sem ele, sem nem saber se ele estava vivo ou morto.”
Nos anos que se seguiram, a fazenda prosperou sob a liderança de Carlos Eduardo, mas a pergunta sobre o paradeiro de Antonio nunca foi respondida. Falsas pistas surgiram e foram investigadas, cada uma delas renovando a esperança da família para depois esmagá-la. Em 2020, eles tomaram a difícil decisão de declarar Antonio como morto presumido, uma formalidade necessária para resolver questões de herança. Mas emocionalmente, eles nunca desistiram. Em 2022, a família contratou uma empresa de investigação privada da Cidade do México. A empresa sugeriu o uso de drones para mapear áreas do deserto que ainda não haviam sido vasculhadas. Em junho de 2024, cinco anos após o desaparecimento, a empresa de drones Tecéo iniciou o mapeamento de uma área de 200 km ao redor da fazenda. O piloto Gustavo Henrique Cardoso usou drones com câmeras de alta resolução e sensores termográficos para detectar anomalias.
Em 17 de junho de 2024, Gustavo estava analisando as imagens quando algo chamou sua atenção. Em uma área de deserto denso, a cerca de 15 km da fazenda, a vegetação parecia diferente. Uma anomalia circular no solo sugeria que algo havia perturbado a área. Ele voou um drone para o local e o que viu fez seu coração disparar. Claramente visível de cima, havia a carcaça de um veículo. A descoberta foi imediatamente reportada à família e à polícia. Uma equipe de peritos foi enviada para o local, que era de difícil acesso. Sob a vegetação que havia crescido ao longo dos anos, encontraram uma Toyota Tacoma prata completamente carbonizada. O chassi confirmou: era o veículo de Antonio Carlos Mendes. Dentro da cabine, restos mortais humanos também carbonizados. A análise preliminar confirmou que se tratava de Antonio. Uma corrente de ouro, que Marlene reconheceu imediatamente, selou a dolorosa identidade da vítima.
A cena do crime revelou uma história trágica. A caminhonete foi intencionalmente incendiada. O responsável pelo ato tentou destruir todas as evidências, mas não contava com o avanço da tecnologia. A análise forense revelou que Antonio sofreu um forte impacto na cabeça antes de o veículo ser incendiado. O caso foi reaberto. A polícia investigou mais a fundo os negócios de Antonio e descobriu que ele vinha sendo pressionado por um grupo de invasores de terras que queria tomar posse de parte da sua fazenda, herdada de seu pai. Antonio havia reunido os 2,5 milhões de dólares para contratar advogados especializados e lutar judicialmente contra os invasores, não para fazer negócios ilícitos. Ele marcou um encontro com os invasores, mas a reunião se tornou uma emboscada fatal. Três homens foram presos e condenados: Roberto Silva Campos, o líder do grupo; Valdeci Pereira Neves, seu capanga; e Jorge Henrique Santos, o advogado que fornecia a documentação falsa.
A descoberta do corpo de Antonio trouxe finalmente o encerramento que a família tanto buscava. Marlene, agora viúva, pôde chorar seu marido e dar a ele um enterro digno. A fazenda Santa Helena permaneceu nas mãos da família, com Carlos Eduardo à frente dos negócios. “Meu pai sempre disse que defenderia nossa terra até a morte”, disse Carlos Eduardo durante o funeral. “Infelizmente, foi exatamente isso que ele fez, mas pelo menos agora sabemos que ele não nos abandonou. Ele morreu lutando por aquilo em que acreditava.” O caso de Antonio Carlos Mendes se tornou um símbolo da violência agrária que ainda assola o México, mas também um exemplo de como a tecnologia moderna pode resolver crimes que pareciam impossíveis. A placa na entrada da fazenda hoje homenageia a memória de Antonio, lembrando sua dedicação à terra e sua luta por justiça.